O mundo emite cerca de 50 bilhões de toneladas de gases do efeito estufa (GEE) por ano. Entre eles, está o vilão dióxido de carbono (CO²), principal causador do efeito estufa, provocador do aquecimento global.

Não à toa, há um movimento mundial, liderado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na direção da redução da emissão dos gases do efeito estufa (GEE). É nesse cenário que o mercado de créditos de carbono surge como uma oportunidade de gerar receita e reduzir emissões. Tudo isso ocorre, ainda, em meio ao crescimento da agenda ESG.

Segundo projeção da WayCarbon e ICC Brasil, até 2030, o Brasil pode atender de 22,3% a 48,7% da demanda global por créditos de carbono do mercado voluntário. Assim, o potencial para gerar receitas com essa demanda é de até US$ 120 bilhões. Hoje, o país atende apenas 12% da demanda mundial.

Diante desse mercado bilionário, as cooperativas, pautadas pelos princípios de intercooperação e o interesse pela comunidade, tornam-se viabilizadoras de projetos voltados à geração de créditos de carbono. Isso ajuda na agenda mundial de sustentabilidade e, ao mesmo tempo, gerando empregos e renda.

Neste artigo iremos entender o que são os créditos de carbono; o que é o mercado voluntário e o regulado; conhecer o cenário de oportunidades que esse mercado oferece, além de ver exemplos de cooperativas que já atuam nesse mercado. Aproveite a leitura!

Créditos de carbono: o que são

O mercado de créditos de carbono começou a ser discutido a partir da Cúpula do Clima e do Aquecimento Global (COP3), realizada em Kyoto, em 1997. Foi durante o evento que os países participantes assumiram compromissos com a redução de emissão de gases do efeito estufa (GEE) e assinaram o Protocolo de Kyoto.

Com a assinatura do Protocolo, foi criado o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que validaria e certificaria as ações adotadas pelos países signatários. Assim, ficou definido que a cada tonelada de carbono que deixa de ser emitido, o MDL gera um crédito que pode ser comercializado entre os países, a fim de atingir a meta de redução de emissão.

Mercado regulado e mercado voluntário de créditos de carbono

Hoje, há dois mercados de créditos de carbono que existem paralelamente. Um deles é o mercado regulado, oriundo do Protocolo de Kyoto, em que a comercialização de crédito de carbono ocorre entre países. Esse mercado é regulado pela ONU e tem como fim o cumprimento das metas de redução da emissão de carbono.

O outro é o mercado voluntário. Nele, as transações ocorrem por meio de iniciativas da sociedade civil, cidadãos, cooperativas, empresas mercantis e ONGs, entre outras instituições, que não estão atreladas ao Protocolo de Kyoto e suas metas. Para isso, essas iniciativas precisam ser auditadas por entidades independentes e, com isso, também poderem comercializar créditos de carbono.

No mercado voluntário, por exemplo, uma cooperativa pode decidir iniciar um projeto de redução de emissão de CO² por meio de ações de preservação de floresta ou replantio de árvores. Desse modo, a cada tonelada de carbono reduzida é gerado um crédito que pode ser vendido, tal como é feito entre países.

Créditos de carbono na COP27

A ONU prevê que, até 2030, haverá um aumento de 10,6% na emissão de gases do efeito estufa. Isso significa, também, que 43% das emissões precisam ser reduzidas.

Durante a  27ª Conferência do Clima das Nações Unidas – COP 27, o tema foi o centro das atenções das discussões sobre de que forma os países estão reduzindo suas emissões e de que maneira é viável financiar o enfrentamento à deterioração climática e ambiental do planeta.

Um dos debates girou em torno de como os créditos de carbono podem viabilizar o cumprimento dos planos de mitigação das mudanças climáticas. A estimativa é que o mercado voluntário precise crescer mais de 15 vezes até 2030 para cumprir o Acordo de Paris, por exemplo, que prevê metas até 2050.

É por isso que o mercado de crédito de carbono tornou-se uma alternativa para empresas e países atingirem suas metas.

Oportunidades no mercado de créditos de carbono

Segundo pesquisa da WayCarbon, entre os setores mais promissores para gerar créditos de carbono no Brasil, estão o agropecuário e o de energia, também fortemente presentes no cooperativismo. Laura Albuquerque, mestre em planejamento energético e ambiental e gerente sênior da WayCarbon, diz que o país pode movimentar entre US$ 493 milhões a US$ 100 bilhões com o mercado de carbono e gerar 8,5 milhões de empregos até 2050.

“Reduzir as emissões é uma oportunidade de novos negócios e fonte de renda para diversos públicos, inclusive pequenos produtores rurais e povos tradicionais, com o fortalecimento das cadeias produtivas”, ressalta Laura durante palestra no evento Fronteiras e Tendências 2022.

De acordo com a especialista, no agronegócio a adoção de uma economia de baixo carbono pode estar voltada a circunstâncias como:

  • Redução do desmatamento.
  • Melhores condições de trabalho.
  • Contribuição para a garantia de segurança alimentar do planeta.

Já no setor de energia, a adoção torna-se importante para a segurança energética e a geração de empregos e de renda. Isso ocorre com a adoção de tecnologias mais modernas, como os biocombustíveis de segunda geração, de energia solar flutuante e eólica offshore.

Títulos verdes

Um outro segmento promissor é o da floresta. Um relatório divulgado pelo Banco Mundial em 2022, indica que o valor de manter a Floresta Amazônica em pé é cerca de sete vezes superior ao lucro que pode ser obtido através de diferentes atividades de exploração econômica da região.

O estudo estima que a preservação da floresta vale, ao menos, US$ 317 bilhões por ano, algo equivalente a R$ 1,5 trilhão.

Segundo o relatório, em pouco anos, a conservação da floresta pode valer mais que a criação de gado, um dos principais causadores do avanço do desmatamento na Amazônia.

Além disso, soluções baseadas na conservação florestal promovem uma economia de baixo carbono, o que pode abrir oportunidade para a geração de títulos verdes, que são títulos de renda fixa emitidos por empresas, governos e organizações para promover iniciativas econômicas de sustentabilidade.

BNDES Créditos de Carbono

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) lançou, em 2022, um programa de compra de créditos de carbono. Dessa forma, a iniciativa tem o objetivo de estimular projetos que visem a preservação do meio ambiente através da redução de emissão de CO².

O BNDES Créditos de Carbono, aliás, é o primeiro do tipo feito por um banco no Brasil. O programa prevê a comercialização de carbono no mercado voluntário através da aplicação de recursos em projetos que geram a redução ou a captura de carbono. O BNDES espera, portanto, conduzir um processo de descarbonização da economia brasileira.

Saneamento e os créditos de carbono

Para o diretor de sustentabilidade da BRK Ambiental, Carlos Almiro, o tratamento de esgoto também representa uma ótima oportunidade para a geração de créditos de carbono. Segundo o executivo, cada estação de tratamento de esgoto tem potencial para ser uma geradora de energia a partir do gás metano, retirado do lodo resultante do tratamento.

Almiro explica que, com o marco regulatório do saneamento, aprovado em 2022, houve um aumento nos investimentos em tratamento de esgoto. Esse processo abre um leque de oportunidades para compensar as emissões de outros setores, como o agronegócio, por exemplo.

Cooperativismo atua no mercado de créditos de carbono dentro e fora do Brasil

De fato, o mercado de créditos de carbono tem encontrado no cooperativismo um caminho viável para desenvolver projetos que consigam gerar crédito e também ser rentável, sobretudo diante dos custos ainda considerados elevados. A seguir, confira três exemplos de iniciativas de sucesso no cooperativismo no mercado de créditos de carbono.

Ceriluz: usinas habilitadas para venda de créditos de carbono

Em 2022, a Ceriluz, cooperativa de energia presente em Ijuí/RS, teve dois projetos credenciados pela Organização das Nações Unidas para negociar créditos de carbono no mercado internacional. Um deles é a usina Linha Onze, uma pequena central hidrelétrica com potencial instalado de até 30 megawatts. O outro é a Usina Augusto Pestana, com potencial para gerar até 1 MG de energia elétrica.

Com o credenciamento na ONU, a Ceriluz poderá negociar os créditos de carbono gerados pelas usinas com países ou instituições que não consigam alcançar suas metas de redução de emissão de CO² e que desejam compensar o impacto de suas atividades na natureza.

Mas essa não será a primeira experiência da cooperativa no mercado de créditos de carbono. Em 2004, a Ceriluz pôs em operação a Usina José Barasuol, que, três anos depois, gerou uma receita de R$ 600 mil referentes à venda de créditos de carbono para uma companhia holandesa.

Cooperación Verde: intercooperação colombiana enfrenta mudanças climáticas

Na Colômbia, 52 cooperativas se reuniram em 2009 para fundarem o Projeto Cooperación Verde, um programa de intercooperação que visa o reflorestamento de regiões atingidas por conflitos armados, comercialização de crédito de carbono e recuperação de solos.

Assim, o projeto promove a compensação das emissões de carbono e, consequentemente, gera trabalho e renda para as populações locais. Ao todo, são cerca de 280 mil toneladas de CO² já capturados, o que gerou uma receita de US$ 2,4 milhões em créditos de carbono e cerca de 100 mil postos de trabalho.

Land O’ Lakes: gigante do agro americano tem programa de créditos de carbono

A cooperativa agrícola norte-americana Land O’Lakes lançou um programa de geração e comercialização de créditos de carbono em 2021. O foco foi na recuperação de solo, através de uma parceria com a Soil Health Institute. O resultado foi 100 mil toneladas métricas de créditos de carbono vendidas para a Microsoft Corp.

Segundo estimativa da cooperativa, os agricultores receberão até US$ 20 por tonelada de carbono na primeira parcela de créditos. Além disso, os cooperados podem acessar os dados históricos disponibilizados pelo projeto, com o fim de obter créditos adicionais para até cinco anos anteriores ao cultivo.

Conclusão

Para implantar um projeto voltado à redução de emissões de carbono, o Observatório de Conhecimento e Inovação em Bioeconomia, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), aponta quatro etapas: elaboração, validação, registro e monitoramento/ certificação.

Primeiro é preciso identificar o potencial da atividade redutora de emissões de CO² e definir a metodologia para a sua quantificação, assim será possível definir a capacidade da geração de créditos carbono. Após isso, o projeto necessita, ainda, ser validado por auditorias independentes e credenciado por certificações padrões de crédito de carbono.

Uma vez auditada e credenciada, é feito o registro do projeto nos mesmos padrões de certificação aplicadas. A partir daí, é possível entrar em operação para emitir os créditos de carbono no mercado voluntário.

É importante, ainda, que o monitoramento e a contabilização da redução de emissões de CO² seja validado por auditoria independente, com o fim de garantir a integridade dos dados e obter a certificação dos créditos gerados, necessária à comercialização.

Por fim, a Análise Econômica 78 traz uma edição especial do Panorama do Coop, que destaca as medidas para conter os avanços das modificações no clima, por meio da economia de baixo carbono. Confira os principais temas de discussão na COP27, as recomendações do relatório de riscos climáticos, os pontos fortes e os desafios do Brasil para o cumprimento das metas do pacto global e as soluções sustentáveis implementadas pelo cooperativismo!